Tão útil como conhecer a biografia de um dos maiores gênios que a humanidade já produziu é poder vê-la reconstruída, com perspicácia, a partir dos cadernos deixados pelo próprio biografado que sobreviveram aos últimos quinhentos anos.
Uma construção antiga próxima de onde resido, localizada em movimentada avenida do bairro de Copacabana, no Rio de Janeiro, é objeto de discórdia familiar. Até onde chegou ao meu conhecimento, o imóvel foi herdado há muito tempo por irmãos que não se entendem sobre sua destinação, nem sobre o preço de eventual venda a terceiros, uma história relativamente comum e que costuma se repetir em muitas famílias humanas.
Quem acompanha as publicações aqui do site deve se lembrar que escrevi recentemente sobre a observação de aves em tempos de quarentena. Para os amantes das aves, observá-las a partir da janela de casa é uma das poucas opções que restam para a manutenção dessa atividade com o mínimo de segurança.
Por força da atual reclusão, o fato é que acabamos ampliando a percepção de nosso entorno. Por esse motivo, só agora me dei conta da presença de um Beija-flor-tesoura que tem visitado com frequência o Oiti, uma árvore originária da Mata Atlântica, cuja copa alcança as janelas de meu apartamento.
Ao longo da última semana consegui fazer alguns registros fotográficos, como o que ilustra esse post. Hoje de manhã, resgatando um antigo tripé que estava em desuso e esquecido fiz um vídeo curto dessa bela ave, que pode ser visto logo abaixo.
Nessa quarentena forçada que pegou quase todo o planeta de surpresa, restaram poucas opções de lazer fora da parafernália tecnológica que nos cerca, isso para quem ainda tem o luxo de estar empregado e com o salário em dia. Uma dessas opções é a observação de aves a partir de uma janela.
Para realizar a atividade não é preciso ostentar uma vista bucólica, qualquer quadrado vazado que aponte para fora é válido, mesmo em se tratando de uma cidade grande de ruas movimentadas.
Exemplo recente disso é o Gavião-carijó (Rupornis magnirostris) que consegui avistar e fotografar em uma das avenidas principais do bairro de Copacabana, no Rio de Janeiro. Minha filha acordou com vontade de aprender mais sobre os pássaros após recebermos no celular o vídeo da varanda de uma amiguinha em que apareciam alguns psitacídeos nas redes de proteção.
Num desses momentos de sincronicidade junguiana fui levado até a janela pois ouvia Cambacicas (Coereba flaveola) agitadas vocalizando sem parar. Ao pegar minha filha no colo para mostrar os passarinhos, qual não foi nossa surpresa ao avistar um Gavião-carijó voando de um Oiti (Licania sp.) para um casario ao lado, onde permaneceu por alguns minutos e nos conferiu uma alegria inenarrável nesse momento de clausura.
Enquanto minha esposa e filha continuavam a fotografar o gavião, ainda tive tempo de fazer um breve registro em vídeo desse instante especial de beleza em meio ao caos que estamos vivendo.
Tucano-de-bico-preto (Ramphastos vitellinus) no ninho
2 MIN, DE LEITURA
Alheias à polarização ideológica e aos discursos inflamados que vivenciamos recentemente com a disputa eleitoral, as aves iniciaram mais uma temporada de reprodução no Jardim Botânico do Rio de Janeiro. É sempre um momento especial poder presenciar sua luta diária mais básica por alimento e abrigo, sem qualquer viés ideológico ou disputa de vaidades.
Grande parte delas constrói seu ninho de forma artesanal, juntando com o bico restos de matéria orgânica como gravetos, folhas secas, barro, etc. Parte delas, contudo, não têm essa habilidade, e por isso precisam encontrar cavidades no próprio ambiente natural, como é o caso desse tucano que ilustra a matéria.
Esse registro fotográfico somente foi possível pela generosidade do colega de passarinhada Carlos Vieira, que teve a iniciativa de mostrar esse oco de árvore aparentemente vazio e sem vida, alertando que tinha avistado no início da manhã um Tucano-de-bico-preto em seu interior.
No instante em que apontou para a árvore, eis que, como mágica, surge o tucano, que intuía a presença de um Sagui à espreita e por isso colocou metade de seu corpo para fora do buraco, buscando marcar presença. Retornou ao interior poucos segundos depois.
Como estamos em plena primavera, ainda dá tempo de visitar as áreas verdes na tentativa de avistamentos como esse. A observação das aves, ao contrário da guerra ideológica travada diuturnamente nas mídias sociais, é atividade que somente evoca os melhores sentimentos humanos. Que tal experimentar?
Oi amigos, tudo bem? Hoje gostaria de dividir com vocês um pouco da sensação que experimentei ao contemplar um casal de Tico-tico (Zonotrichia capensis), no Jardim Botânico do Rio, por ocasião do feriado de Tiradentes.
A referência ao mártir da Inconfidência Mineira, aliás, é bastante pertinente, porque sua luta significou para nós, humanos, a busca da tão sonhada liberdade, e não concebo nada que se aproxime mais simbolicamente desse conceito do que poder observar aves silvestres em seu habitat natural.
Uma das poucas vantagens de ser apaixonado por aves, mas não ter formação em ornitologia, é poder observá-las da forma mais descompromissada possível, chegando a conclusões pessoais - ainda que equivocadas - acerca do comportamento desses maravilhosos seres alados.
Falo, aqui, dos prazeres da contemplação, da imaginação e da descoberta. De poder fazer anotações durante as "passarinhadas", para depois, finalmente, confrontar com aquilo que dizem os especialistas. E foi exatamente isso que fiz, sem planejamento prévio, sobre o casal de Tico-tico que trago nesse post.
Enquanto observava no binóculo esse casal, que estava próximo a um Cambuí-vermelho (Myrcia selloi) em frutificação, fiz os seguintes apontamentos: "silenciosos (fazem o mais absoluto silêncio para se alimentar)"; "se alimentam no chão"; "cavam o solo com as patas e bico para desenterrar os alimentos". Em outra oportunidade, observei um indivíduo adulto cantando durante um bom tempo, e escrevi: "pode ficar vocalizando (cantando) sozinho empoleirado, por vários minutos, às vezes uma manhã inteira".
Reunidas essas informações, consultei então o site Wikiaves, assim como a "bíblia" da Ornitologia Brasileira, de Helmut Sick, e pude então verificar várias semelhanças nas descrições. Tive o prazer de descobrir que há até um verbo bastante usado para o comportamento de revolver a terra com as unhas, em busca de alimento: "esgravatar" ou "esgaravatar". Mas também aprendi que a ameaça à população dos Tico-ticos se dá por cuidarem regularmente dos filhotes do Vira-bosta (Molothrus bonariensis), ave de hábitos reprodutivos parasitários, e não pela presença dos pardais, como popularmente se acredita.
Penso que a riqueza de informações como essas, que podem ser extraídas da atenta observação do comportamentos das aves, é um dos motivos que fazem com que essa atividade cresça a cada ano, no Brasil e no mundo. Afinal, as aves estão espalhadas pelos mais diversos biomas em todos os cantos do planeta, e podem ser observadas por qualquer pessoa minimamente interessada.
Retornando a Tiradentes, quem não as invejaria pela possibilidade de alçar voo, sem ter de pagar altos impostos à Coroa portuguesa?
Como é bom poder acordar bem cedo e percorrer as ruas da cidade ao encontro de pessoas que, assim como você, deram uma pausa em seus compromissos para desfrutar o que a natureza tem de melhor, numa atmosfera de plena harmonia e celebração da vida!
Foi nesse clima de confraternização que ocorreu, no último sábado (2 de abril), mais uma passarinhada no Jardim Botânico do Rio, nesse início de outono atípico para os cariocas, com temperaturas elevadas e bastante calor.
Fiquei muito feliz ao encontrar novos rostos no passeio, alguns já conhecidos das redes sociais, mas que eu ainda não havia tido a ocasião de conhecer pessoalmente, outros que foram observar e fotografar aves pela primeira vez, e se encantaram, como era de se esperar.
Aos amigos que acompanham o blog há algum tempo, peço desculpas pela carência de fotografias de aves nesse post, mas como nos últimos textos me dediquei ao registro da floração das árvores, hoje pude constatar que a fotografia de aves exige, sim, prática constante, já que quase sempre é preciso ser "rápido no gatilho".
Sabiá-laranjeira (Turdus rufiventris) (clique para ampliar)
Na região do Jardim conhecida como "restinga", registrei uma Lavadeira-mascarada (Fluvicola nengeta) "adensando" com seu corpo o ninho em construção, que é formado por gravetos em vegetação próxima à água, algo bem característico da espécie e que tem a vantagem evolutiva de dificultar a predação.
Lavadeira-mascarada (Fluvicola nengeta) "adensando" ninho em construção (clique para ampliar)
Também registrei um simpático filhote de Saracura-do-mato (Aramides saracura), bem próximo ao Lago Frei Leandro, o que chamou bastante a atenção de adultos e crianças, que estavam em bom número no passeio.
Filhote de Saracura-do-mato (Aramides saracura) (clique para ampliar)
Muitas outras espécies foram avistadas, algumas relativamente difíceis de ver no Jardim, seja por sua raridade no local, como o Baiano (Sporophila nigricollis), seja pelo grande talento da ave para a camuflagem, como é o caso da Alma-de-gato (Piaya cayana). Nesse caso, pouparei os leitores dos registros, que definitivamente não ficaram bons.
Como sempre, foi um grande prazer passar bons momentos junto de pessoas que partilham desse saudável e fascinante passatempo que é a observação e fotografia de aves.
Aos amigos de passarinhada, agradeço por tornarem fins de semana como esse algo realmente especial. Aos amigos "virtuais" que acompanham o blog e ainda não foram ao Jardim, deixo também meu fraternal abraço, e um convite, para que qualquer hora apareçam por lá, pois certamente sairão renovados e prontos para mais uma semana de compromissos.
Observação de aves no Jardim Botânico do Rio de Janeiro
Oi amigos, tudo bem? Há algum tempo vinha pensando em tratar das razões que justificam a apaixonante prática da observação das aves, com o objetivo de estimular a atividade e atrair novos adeptos, sempre em nome da conscientização e preservação ambiental.
Abaixo indiquei 5 razões, mas caso você tenha mais a acrescentar ficarei muito contente se puder mencioná-las no campo para comentários, localizado no final do artigo:
1 – Forma de lazer saudável
Observar aves em vida livre (“birdwatching”) é uma atividade praticada por milhões de pessoas em todo o mundo, das mais variadas profissões.
É considerada por muitos uma forma de lazer saudável, por propiciar a integração familiar e a construção de novas amizades, já que a atividade costuma atravessar gerações e normalmente há programação de viagens entre os integrantes de um grupo de observadores de aves.
2 – Facilidade de observação
A maioria das espécies de aves tem hábitos diurnos e cantam, além de estarem espalhadas pelos mais diversos locais, inclusive ambientes urbanos, o que facilita a observação de seu comportamento.
No caso do Brasil, temos a sorte de ocupar uma das melhores posições no ranking da biodiversidade de aves. Como já divulgamos aqui no blog, nosso país alcançou o segundo lugar mundial na primeira edição do Global Big Day, ocorrida em maio de 2015.
3 – "Hobby" para todas as idades
A observação de aves é acessível a praticamente qualquer pessoa, bastando um olhar atento para apreciá-las normalmente em busca de alimento, de um parceiro ou na defesa de território.
Neste blog, na guia Aves, localizada no menu superior, você poderá saber mais sobre elas e também encontrará dicas para observação das aves que irão enriquecer sua experiência e tornarão a atividade ainda mais prazerosa.
4 – Utilidade científica
Com o uso da internet e especialmente após o advento do site Wikiaves, a maior rede social brasileira de observadores de aves, um importante volume de dados é gerado todos os dias, servindo como base para estudos científicos nas áreas de ecologia e conservação das aves e do meio ambiente em geral, já que as aves são consideradas excelentes “bioindicadores” da qualidade ambiental.
5 – Fomento ao turismo ecológico e à conscientização e preservação ambiental
A prática do “birdwatching” favorece o turismo ecológico e estimula os mercados de equipamentos, editorial e de hotelaria.
Ao mesmo tempo, para a manutenção desse segmento econômico, é imprescindível que as atividades exercidas causem o menor impacto ambiental possível, sob pena de comprometimento do próprio mercado, o que é bastante significativo para a conscientização e preservação ambiental.
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Outras razões poderiam ser mencionadas, como o contentamento puro e simples da contemplação das aves ou o prazer estético de fotografá-las, além do sentimento de plenitude que costuma acompanhar quem se dedica a essa prazerosa atividade, considerada, na linguagem médica, verdadeira "terapia ocupacional".
E você, vê outras razões para a prática do “birdwatching”? Deixe aqui seu comentário, compartilhe o link desse post nas redes sociais e ajude a difundir essa atividade que a cada dia ganha mais adeptos no Brasil e no mundo!