Mostrando postagens com marcador estética. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador estética. Mostrar todas as postagens

O homem e a natureza


Canário-da-terra (Sicalis flaveola) jovem

Há alguns meses destaquei nesta publicação o interessante estudo de Elaine Scarry, professora de ética da Universidade Harvard, acerca das relações entre a estética e a ética (a matéria pode ser acessada clicando-se neste link).

Hoje retorno ao assunto, mas trazendo um alerta: o uso inadequado de nosso senso estético pode impactar diretamente a biodiversidade. Vejamos um exemplo.

Recentemente, estive em um parque urbano para observar o comportamento das aves e notei que os canários-da-terra e os coleirinhos, cuja dieta inclui principalmente sementes de gramíneas, pareciam famintos (na foto que ilustra o post, que não foi um registro isolado, vemos um jovem canário-da-terra tentando consumir uma folha seca).

A sazonalidade poderia ser apontada como razão para a indisponibilidade das gramíneas nessa época do ano, mas na ocasião observei que funcionários utilizavam várias roçadeiras na poda de grande extensão dos gramados.

Saí dali, então, com algumas perguntas que gostaria de dividir com o leitor, para reflexão: de onde surgiu a ideia de que gramado aparado é esteticamente mais bonito? Se sabemos que algumas espécies de pássaros se alimentam das sementes de gramíneas, por que não deixar o gramado alto para facilitar a alimentação das aves?

Um jardim considerado "bem cuidado" parece ainda demandar o aparo constante do gramado, mas não devemos perder de vista que nossos gostos podem impactar diretamente a biodiversidade, se estamos efetivamente preocupados com a conservação ambiental.

Uma solução de fácil aplicação seria aparar apenas as beiradas dos gramados, deixando a parte central livre para o crescimento. Penso ser essa uma medida capaz de atender nosso senso estético e, ao mesmo tempo, o manejo ecologicamente equilibrado dos jardins. Por que não?


Pílula Ecológica


Como exemplo de visão integrada e abrangente do meio ambiente, oportuna a leitura do belíssimo poema "Leilão de Jardim", de Cecília Meireles, cujos versos falam por si:


Quem me compra um jardim com flores?
Borboletas de muitas cores,
lavadeiras e passarinhos,
ovos verdes e azuis nos ninhos?

Quem me compra este caracol?
Quem me compra um raio de sol?
Um lagarto entre o muro e a hera,
uma estátua da Primavera?

Quem me compra este formigueiro?
E este sapo, que é jardineiro?
E a cigarra e a sua canção?
E o grilinho dentro do chão?

(Este é o meu leilão.)

Cecília Meireles



Cadastre-se

* preenchimento obrigatório

Sobre estética e ética


Ninfeia (Nymphaea sp.)

Além de contemplar a natureza e fotografá-la, gosto muito de literatura. Com o tempo descobri que ela permite integrar a beleza estética do mundo com algo interiormente significativo. 

Diante da enormidade de informações a que somos submetidos todos os dias nas mídias digitais, tenho lido menos do que gostaria, mas o suficiente para não deixar a imaginação adormecida.

Numa dessas andanças em livrarias da cidade, deparei com o excelente livro Ponto de Fuga: conversa sobre livros, da imortal Ana Maria Machado, em que a autora, ocupante da cadeira número 1 da Academia Brasileira de Letras, destaca um estudo muito interessante de Elaine Scarry, professora de estética da Universidade Harvard, acerca das relações entre a estética e a ética, denominado On Beauty and Being Just.

Segundo Ana Maria Machado, a autora sustenta que o convívio com o belo renova nossa busca de verdade e nos empurra em direção a uma preocupação cada vez maior com a justiça, acentuando que o desenvolvimento da percepção da simetria e harmonia nos leva a buscar uma distribuição equilibrada. E que a intensidade do maravilhamento com a beleza tende a ser expansiva, levando a pessoa a querer dividir suas sensações com os outros.

Eis aí, portanto, mais um motivo para a preservação ambiental: conservando as paisagens naturais estamos, ao mesmo tempo, resguardando às atuais e futuras gerações o acesso à mais essencial fonte do prazer estético, que, segundo o estudo de Scarry, encontra-se intimamente ligado ao desenvolvimento ético do ser humano.

PS: Para quem se interessou pelo livro de Ana Maria Machado, escrevi uma resenha sobre ele no Skoob, a maior rede social brasileira direcionada aos leitores. Para acessar a resenha, basta clicar aqui.



Cadastre-se

* preenchimento obrigatório